Educação sexual - Discussão polêmica e necessária
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Por Isabelle Lindote
Em 2008, o nascimento de Valentina, um bebê, fruto do amor
entre Maria Gabriela Damate, com Síndrome de Down, e Fabio Marcheti, que possui
atraso mental, causou polêmica e foi manchete de jornais e revistas de todo o
país. A gravidez não-planejada e descoberta no sexto mês de gestação levantou
uma polêmica: a falta de orientação sexual para deficientes intelectuais. Não
há problema algum no nascimento de filhos entre esses casais, porém a falta de
acompanhamento pode gerar outros problemas, além de gestações indesejadas. Sem
informação, essas pessoas ficam expostas a doenças venéreas e podem até se
tornar alvo de violência durante o ato. Por isso, a prevenção feita de maneira
saudável serve como uma proteção. O deficiente precisa aprender os limites que
precisam ser respeitados nas relações. A negligência, a falta de informação e a
discriminação são alguns dos fatores que fazem o assunto ser tratado com
resistência.
A Associação para Valorização e Promoção de Excepcionais
(AVAPE) criou, há um ano, o "Grupo de Sexualidade" para o atendimento
e orientação de pessoas com deficiência intelectual. Dezoito pessoas, homens e
mulheres, na faixa dos 18 aos 30 anos de idade, se encontram uma vez por
semana, sob a supervisão de Denise Teixeira, psicóloga especialista em
sexualidade. "Criamos esse grupo por sentir a necessidade de orientação. É
comum termos casos de abuso ou práticas sexuais sem os cuidados necessários
como o uso do preservativo", explica. Uma vez por mês os pais se reúnem
com a psicóloga para abordar, além da sexualidade dos filhos, questões como
casamento. Uma pesquisa realizada pela AVAPE com 145 pais de pessoas com
deficiência intelectual constatou que 70% deles não orientam os filhos sobre
sexualidade.
Aproximação da realidade
De acordo com Denise, as pessoas com deficiência
intelectual são facilmente manipuladas, o que as torna suscetíveis a abusos
sexuais e, por outro lado, questões como o prazer e experimentar o
"novo" também são comuns e atrativos para eles. Dinâmicas de uso da
música, objetos, figuras ilustrativas e técnicas de expressão corporal auxiliam
na descoberta e no entendimento do próprio corpo dos participantes do grupo.
Bonecos e objetos de silicone ajudam na explicação de assuntos ligados
diretamente ao ato sexual e suas consequências.
Como qualquer outro indivíduo, eles também tem necessidade
de expressar seus sentimentos de modo próprio.
Por isso, a repressão da sexualidade, atitude que muitos
pais tomam para tentar proteger seus filhos, pode alterar seu equilíbrio
interno e seu desenvolvimento psíquico. Logo, a sexualidade bem encaminhada
melhora o desenvolvimento afetivo, facilita a capacidade de se relacionar, aumenta
a autoestima e ajuda o deficiente a sentir- se mais integrado à sociedade.
O jovem Deleon de Oliveira, de 22 anos, foi incluído no
programa a pedido de sua mãe. Vera Lúcia dos Reis de repente se deparou com uma
realidade que ela nem imaginava que pudesse existir: o filho com deficiência
intelectual não só tinha uma namorada, como andava com camisinha na carteira e
já tinha tido relação sexual. "Não imaginei que ele sabia o que era sexo e
como se fazia", conta. A psicóloga diz que Vera fez o correto: buscou
orientação para ela e para o filho, em vez de negar a realidade.
Educação
Uma pesquisa inédita do Ministério da Saúde, divulgada em
novembro de 2008 e realizada com 2.238 pacientes, em 11 hospitais psiquiátricos
e 15 Centros de Apoio Psicossocial (CAPS), revelou que 0,8% dos deficientes
intelectuais são portadores do vírus HIV. Entre a população em geral, o índice
é de 0,61%. Segundo a coordenadora do Programa Nacional de DST e Aids,
Mariângela Simão, este grupo de pacientes está vulnerável às doenças
sexualmente transmissíveis porque recebem menos atenção. O levantamento mostrou
que 88% dessas pessoas já mantiveram relações sexuais, 61% fizeram sexo nos
últimos seis meses, 16% disseram ter tido mais de um parceiro nos últimos seis
meses e apenas 7% afirmaram ter usado preservativos durante o sexo.
"Conhecer a realidade do HIV e de outras doenças sexualmente
transmissíveis nessa população é o primeiro passo para construir ações que
enfrentem o problema", afirma Mariângela.
O Instituto Kaplan oferece cursos de capacitação para
educadores em diferentes temas, incluindo a sexualidade da pessoa com
deficiência intelectual. Ministrados de forma lúdica e priorizando jogos e
dinâmicas como meio de informação, os cursos permitem que o professor aprenda
ferramentas de como trabalhar o assunto com seus alunos especiais. Há também
outros lugares nos quais pessoas com deficiência podem ser orientadas, como no
caso do Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), no Rio de Janeiro. O
instituto possue diversas formas de orientar, desde ministrar cursos
profissionalizantes até palestras sobre sexo e prevenção de doenças. Procurar
informações em centros de apoio à pessoa com deficiência, como associações e
institutos regionais, é uma forma de mostrar que a sexualidade pode e deve ser
orientada dentro e fora de casa.
Violência dentro e fora de casa
Dentro do grupo de sexualidade da AVAPE, das 18 pessoas,
oito admitiram já ter sofrido abuso sexual. Na maioria dos casos, a violência é
cometida por pessoas próximas das vítimas, como vizinhos, familiares ou amigos
de parentes. Os violentadores abusam da falta de malícia e da inocência das
pessoas com deficiência intelectual, que não conseguem se defender do assédio.
Destes casos dentro do grupo, nenhum chegou à polícia e os criminosos ficaram
impunes. Há registros nos depoimentos dos entrevistados de casos de maus tratos
físicos, exploração, negligência e abandono. No entanto, durante esse ano de
atividades, a psicóloga já ouviu dos participantes relatos positivos em
decorrência desse trabalho. Caso de uma menina abordada na rua por um homem que
a convidou para fazer sexo com ele. "Houve a recusa por parte dela, que
imediatamente nos relatou o ocorrido, afirmando que sabia as consequências daquele
convite", relata Denise.
Desmistificando as crenças
Débora Gejer, médica pediatra especialista em adolescentes
e presidente da Associação para o Desenvolvimento Integral do Down (ADID),
comentou sobre as principais crenças comuns quando se trata da sexualidade de
pessoas com deficiência.
Deficientes não são
sexualmente ativos.
Embora alguns adolescentes possam ser menos aptos que seus
pares para serem sexualmente ativos, a crença é infundada, pois não se deve
assumir que a condição de deficiência, por si só, preveja o comportamento
sexual.
As aspirações
sociais e sexuais de deficientes são diferentes dos seus pares.
Apesar do isolamento social que muitos deficientes
vivenciam, estudos demonstram que estes jovens gostariam de ter relações
sexuais, de casar e de ter filhos. Na verdade, o que ocorre é que essas pessoas
têm menos oportunidades de explorar alguma relação com seus semelhantes, o que
dificulta o alcance de suas aspirações.
SERVIÇOS
Sites
que explicam mais sobre o tema
Como falar de sexo com filhos deficientes - www.acessa.com/direitoshumanos/arquivo/materias/2007/03/05-sexualidade/
Site oficial sobre Aids e
sexualidade -
www.aids.gov.br
Núcleo de Informação à
Pessoa com Deficiência - www.nppd.ms.gov.br
A Sexualidade da pessoa
com deficiência física - www.entreamigos.com.br
Sexualidade da pessoa com
deficiência - http://deficiencia.no.comunidades.net
Livros que ajudam a
entender o assunto
- Sexualidade e Deficiência: Rompendo o silêncio - Ana Rita de Paula e Penha Lopes Editora Expressão e Arte
- Revolução Sexual sobre Rodas Conquistando o Afeto e a Autonomia - Fabiano Puhlmann Editora O Nome da Rosa
- Reabilitação Sexual do Deficiente - Christiane Fürll-riede, Ralph Hausmann e Wolfgang Schneider Editora Revinter
- Sexualidade de Cegos - Maria Alves de Toledo Bruns Editora Átomo
Locais onde buscar
orientação:
- Instituto Beneficente Nosso Lar (11) 2272-5266
- Instituto Kaplan - Centro de Estudos da Sexualidade Humana, com serviço gratuito de orientação sexual pelo 0800-552533, das 9 às 20 horas, de segunda à sexta-feira - www.sosex.org.br
- Sociedade Brasileira de Estudos em Sexualidade Humana (21) 2494-1087/2493-9657 - www.sbrash.org.br
Fonte: Revista Sentidos
Fotos: Shutterstock
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